sábado, 1 de outubro de 2016

uncharted 4: a thief's end - 2016 - spoilers

uncharted eh o jogo que faz voce esquecer da hora e virar a noite correndo contra o tempo para chegar ao fim, e ai voam 15 horas e voce nem percebe.

em epoca de netflix e series, todomundo pode acusar de facilmente se perder no tempo e matar uma temporada inteira numa noite (ainda mais nessa modinha de temporadas de 6 episodios, agora mata um arquivo x, 24 episodios de 1h, de uma lapada so que eu quero ver), e por mais que a gente sinta isso, o que distingue todos os uncharted, e especialmente o 4, do binge de series, filmes ou ate outros jogos eh que nao existe praticamente coisa alguma pra quebrar o ritmo da historia que esta sendo contada, assim, toda a experiencia eh como um filme muito fluido. enquanto normalmente, por mais que voce esteja empolgado, uma serie te faz ver a hora entre episodios e um jogo comumente te da uma sensação de conclusao quando voce termina uma area ou mata um boss.

ultimamente, toda historia eh contada com seus picos e vales, e embora hoje muito do que vemos termine sempre num cliffhanger e nos deixe querendo mais entre unidades, existe uma estrutura padrao de contar historias que te da o sentido de conclusao de uma parte, capitulo, livro, ep, uma sensaçao de fechamento de arco. momentos assim te fazem parar e sentir o cansaço, ou ver a hora e decidir continuar ou nao. uncharted nao te da essa oportunidade, e isso eh um merito da alta qualidade do historytelling da naughty dog, aprimorado a cada novo installment desse jogo, quer você considere bom ou nao.


em a thief's end o historytelling so melhorou, os graficos, os cenarios e direçao e todos os demais elementos trabalham juntos para fazer voce sentir e entrar na historia com os dois pe, e por mais que a historia em si seja uma que eu acho que podia ser melhor, a capacidade de contar essa historia eh absurda.

sabemos do valor do espaço em branco, no audio, na diagramaçao, no video, ha um espaço em branco (ou preto) responsavel por dar a sensaçao de fim e prenunciar o proximo capitulo. em uncharted se esse momento existe eh tao breve que nao se sai por percebido. o capitulo eh anunciado no topo da tela com seu numero e nome e as vezes chega a surpreender por voce nao esperar ja ter chegado em outra fase do jogo, muito embora seja bastante perceptivel pela mudança de temas ou direçao dos personagens.


historia

com um historytelling tao envolvente eh uma pena que a historia em si deixe a desejar. o tatulo: a thief's end parece remeter a historia de henry avery, dono de mais esse tesouro que nate ansia em procurar, mas para mim eh uma alusao a ultima aventura de nathan drake e sua real final aposentadoria da carreira de ladrao/explorador/aventureiro/genocida. essa promessa de fim ja foi feita no uncharted 3, assim, o 4 começa mostrando um nathan estabelecido, com casa e emprego, casado com elena, e a melhor parte das cenas introdutorias/tutorial do jogo eh essa. o começo mesmo do jogo eh numa fase com nathan criança pulando por telhados com o irmao mais velho sam, e para mim eh mais como uma peça obrigatoria, meio sem sal, para, alem de introduzir as mecanicas de jogo, introduzir o tema do relacionamento entre nathan e o irmao, que sera desenvolvido e aludido a ao longo do jogo.

eh uma entrada sem sal para um prato principal melhor, e uma entrada que meio que arruina um pouco o ultimo jantar. pra mim eh um grande defeito de sequels e um erro comum, para criar uma grande historia, os autores arranjam momentos da vida do personagem ainda nao explorados para dar uma nova luz. mas se o nathan de sempre soubesse usar o grappling hook desde criança, porque nao o utilizou nos jogos anteriores? esse elemento da mecanica que se torna um elemento de bonding dos personagens poderia ser introduzido mais tarde na timeline da vida de drake para ser menos conflitante com o resto de sua história acrobatica, ou podia ser um simples hey, here's a grappling hook, use it.

o relacionamento de nathan com elena eh o grande elemento de amargor na historia. da pra perceber que eh proposital, e bem conduzido e executado no historytelling, o que eh clamoroso e sensacional, mas nao deixa de ser um elemento fraco, um golpe baixo. explicando: apos as fases com sam somos levados ao present day nate, introduzidos a sua vida atual vemos um escritorio saudoso de aventuras, porem relegado ao sotao, e um nathan feliz no casamento mas incerto sobre a satisfaçao com a vida atual.

ai o irmao aparece, surpresa, não morri, afinal, me introduziram nesse jogo, nao era pra morrer de verdade no tutorial ne msm, e eita, por acaso estou sendo extorquido a procurar um tesouro por um druglord, vamos nessa? 

tudo bem, a gente sabia que o irmão ia voltar, pra mim a merda eh porque eh aquela forçadinha pra nos fazer sentir por um personagem mas ele eh introduzido e  morto com tanta pressa que nem da pra sentir muito, um trope bem gasto no entrenimento de hoje. mas a grande cagada mesmo eh que nathan decide simplesmente mentir pra a mulher sobre a viagem em busca do tesouro, muito embora ele tenha a melhor historia pra contar do mundo. alo, amor? tudo bom? olha, tenho uma noticia boa, surpreendente, mas depois tem uma parte que talvez você não vai gostar: sabe meu irmao? pois eh ele nao morreu, ai sabe aquela cadeia daquela historia que contei? pois eh ele tava preso la mas ai fugiu com um cara que agora ta extorquindo ele entao vamos caçar um tesouro pra nao matarem meu bro, valeu? xau te amo bjmeliga!

pra mim um ponto fraco pesado na historia, mas mesmo assim, eh tão bem contado que eu so posso acreditar que foi muito bem escrito e engenhado para ser assim. isso porque nathan esta bem enquadrado como a pessoa que esta fazendo errado, quanto a isso, podemos considerar que sam eh seu id e sullivan seu superego. e o superego, alem de chegar tarde na brincadeira eh completamente ignorado. isso eh muito claro na hora que elena chega no hotel onde nathan e cia estão e arma o barraco com essa mentira safada dele. ele eh confrontado com uma realidade diferente da que estava tendo, de sair por ai resolvendo misterios matando gente e pulando de pedra em pedra, pra a realidade da vida estabelecida e de acordos e promessas em casal. seu id eh confrontado, o personagem do seu irmao no canto da cena enquanto sully tenta tomar a frente mas nathan prontamente manda ele pastar para poder seguir em frente com a caça ao tesouro.

as cenas seguintes mudam de tom, apesar de continuar seguindo seu id, a coisa tem menos graça, o irmao continua tentando anima-lo mas a coisa toda fica com um gosto amargo e meio sem graça, como querer continuar brincando depois de levar um rela da mae. eh meio birra querer continuar sem ouvir a razao ou tentar endireitar os erros, ai você brinca so mais um pouquinho pra mostrar que ta contrariando e vai dormir muxoxo.

esse e outros momentos desse jogo com gosto amargo, momentos onde você gostaria de nao jogar, ou de fazer diferente mas se sente forçado a continuar pela sua vontade, analoga a do personagem, de descobrir o tesouro e saciar essa curiosidade, sao momentos unicos em jogos que so posso citar de memoria em neste jogo e em spec ops: the line.

apesar desses pontos fracos da historia, o fato que voce sente quase na pele a merda que o personagem fez e como explorar perde um pouco a graça mostra que foi muito bem executado, e falando em sentir:

a historia pode ser claramente dividida em duas, como nos outros uncharted, e ate no ultimo tomb raider. a historia de drake e amigos, e a historia de henry avery e os piratas. a segunda eh muito boa, e contada de um ponto de vista de descobertas que revelam partes da historia, que vao se juntando para formar uma imagem maior, eh a historia de como henry avery  escondeu o biggest tresure yet, criando uma cidade pirata e tudo. a primeira historia eh a do proprio drake. essa eh vazia, talvez tao vazia quanto a sua presença fisica prostrado na frente de uma tela apertando um plastico preto com os indicadores e polegares por horas. menos. a historia de drake eh uma de ser traido, ser surpreendido, mentir, ser o mais esperto mas estar sendo atropelado pelos seus perseguidores. a historia de drake nao eh emocionante, pode ser se voce considerar todas as acrobacias e tiroteios, mas para mim ele eh mais um espectador como o jogador. ele esta atras de uma tela, pra ele a tela do tempo, assistindo a historia de henry avery assim como nos.

talvez virou um standard do genero hoje em dia, e se eu estou certo, eh merito da naughty dog ter criado esse padrao com todos os uncharted, revivendo o verdadeiro feeling dos filmes de indiana jones.


esse eh pra mim o mais forte desse jogo. olhando para tras talvez nao perceberiamos nada demais em uncharted 3 hoje, mas a naughty dog esta sempre a frente em narraçao, graficos e expressoes. esse eh um jogo como poucos onde voce pode dizer que riu involuntariamente. ri das piadas de nathan com elena no começo, ri quando ele faz cocegas nela, ri quando ele joga crash bandicoot fazendo pouco caso do jogo enquanto ela esta na ponta do sofa com os olhos brilhando. os dialogos durante todo o jogo sao emocionantes, bem atuados e profundos na historia dos personagens.

eh o unico jogo que posso dizer que senti cheiros. os cenarios sao tao bem desenvolvidos que atualmente eh impossivel estar mais imerso em uma experiencia como nesse jogo. senti o cheiro das algas que ficam presas nas pedras da praia quando a mare esta baixa, senti o cheiro de vegetaçao com barro e terra molhada enquanto eles atravessavam madagascar, senti o gosto da primeira cerveja gelada num dia quente com o vento e respingos de água salgada do movimento do barco batendo no rosto. senti o cheiro de ferro das pedras vulcanicas expostas ao mar levemente erodidas e corroidas por anos de oxidaçao. podia seguir talvez ad infinitum.

infelizmente, com tanto realismo se paga um preço. um problema que senti tambem em gtav. o mundo eh tao real, tao vasto, que a coisa de colecionar e explorar praticamente perdem o sentido. em gtav me lembro que quando zerei o jogo, apos a ultima cutscene a camera voltou ao personagem e eu dei uns passos para o lado, pegando um item de coleçao sem querer, a tela me mostrou embaixo: 1 de 1000. eu passei o jogo inteiro sem ver sequer 1 desses itens, tanto que eu achava que gta tinha amadurecido e parado com a coisa de colecionaveis. gta eh um sandbox open world, eh enorme e cada vez maior, com realismo as coisas ficam menores, os personagens correm menos e pulam menos alto, o que aumenta ainda mais as distancias a serem percorridas.

uncharted 4 nao é um open world, pelo contrario, eh uma história fixa, on rails, mas nunca os rails estiveram tao grandes. os cenarios sao tao grandes que você pode jogar, andando de jipe em madagascar, realmente acreditando que ha ali uma madagascar inteira pra explorar, todos os cenarios exceto as sequencias de puzzle de escalada tem essa sensaçao de vastidao, que se você simplesmente for para onde voce tem que ir o mundo realmente parece infinito, parece que voce podia ir para qualquer lugar se voce realmente desejasse ignorar o seu destino, o objetivo da missao.

e eu nao tou dizendo que pagar esse preço eh ruim. o ruim vai depender do tipo de jogador, se voce for um completionist ou um explorador eh facil perder horas fazendo nada no jogo. eu devo ter passado metade do tempo de jogo na parte do roubo da cruz explorando os telhados e pulando em janelas e beiradas procurando outros caminhos e tesouros secretos, na verdade foi nessa missao que peguei meu primeiro tesouro no jogo e percebi que devo ter passado batido por uns 10 tesouros em fases anteriores. em madagascar eu devo ter passado mais tempo passeando e procurando os limites da fase e dando rabiada, jogando o carro em barrancos e pulos por puro prazer do que indo em direçao ao objetivo. enquanto pra mim dirigir o jipe em madagascar foi muito divertido, ficar pulando em todo tipo de telhado e beirada atras de tesouro nao eh.

jogos hoje em dia sempre tentam lhe dar uma sensaçao de urgencia, que eh otimo para a narrativa e historytelling e emoçao do jogo, mas ao mesmo tempo coloca esses tesouros e colecionaveis minusculos espalhados pelo jogo, e como esse realismo tanto que nathan nem um botao de sprint tem, se torna um jogo a parte simplesmente procurar todas as porcarias escondidas.

eh o preço desse realismo e vastidao, e talvez um resultado e construçao de uma nova forma de jogar, primeiro jogar curtindo o jogo e depois fazer uma segunda playthrough ou no caso de sandboxes continuar explorando e vivendo aquele mundo em busca dos colecionaveis.

pra mim eh melhor simplesmente ignorar os colecionaveis, com uma historia tao boa e principalmente tao bem contada, esquecer que eh um jogo e viver um pouco desses momentos e emoçoes.


mecanica

essa nova aventura de nathan drake demorou pra sair. muito mudou entre uncharted 3 e uncharted 4. nesse meio tempo tivemos last of us e tomb raider. uncharted 3 ainda é melhor que esses dois, embora a historia de last of us seja a mais emocionante, e tomb raider seja mais novo, tem uma coisa estabelecida nesse genero puzzle/plataformer/shooter entre u3 e u4 que eh dificil explicar na totalidade, mos podemos ver alguns pontos.

primeiro, mecanicas mais duras, mais scriptadas, e menos espaço para criatividade do jogador. u4 herdou de lou a coisa das beiradas so um pouco altas demais para pular sozinho, as escadas quebradas exatamente onde voce nao pode alcançar e etc, que te forçam a usar o companheiro a.i. pra subir, exceto que como so tem esse caminho mesmo no jogo, seu companheiro não eh nada mais do que uma escada interativa. o jogo sente que ta repetitivo ai certas fases tentam dar uma mudada na dinamica mas eh basicamente sempre a mesma coisa que chega a enjoar, junto a isso tem a porra das beiradas que voce tem que alcançar movendo uma caixa. uma fase que a caixa esta longe pra caralho inclusive, mas o jogo eh tao real que voce quer simplesmente empilhar uns caixotes ou uns toneis pra subir e pronto.

segundo, mecanica inspirada em tombraider i.e.: a buceta da cordinha que você tem que sacudir pra todo lado se quiser ir pra frente, cordinha que nathan nunca tinha usado ate agora e tava just fine. conrdinha inclusive que quebra a suspension of disbelief, eu sei que as escaladas sao impossiveis por si so mas voce pode dar uma pausa no disbelief pra acreditar que ele eh capaz, mas a corda em tomb raider e em uncharted ficou ainda aquela coisa mal acabada, ela volta sozinha, desprende sozinha, muda de tamanho e se amarra organizadamente na calça do cara.

falar de mecanica ainda eh falar de historia, de certa forma. assim como graficos, esses elementos estao trabalhando para contar a historia. buscar uma apresentaçao cinematica e photorealista tem seu preço. muito do jogo nao passa mais a sensaçao de desafio real. as plataformas e escaladas sao simples, ate cansam, a mecanica de briga eh crua pra um jogo de hoje em dia, mash x pra dar porrada e triangulo as vezes pra se livrar de um grapple. eh tao inferior a por exemplo batman arkham asylum e dark souls que sabemos que é de proposito. isso nao eh desculpa no entanto, se o jogador vai ser forçado a lutar, que pelomenos o sistema seja decente e lhe de algo de desafio e curva de aprendizado.

os tiroteios sao aquilo de todo cover based shooter, o problema ai pra mim nao eh a mecanica, mas o realismo, fica meio ridiculo um jogo tao real, um explorador-arqueologo-dive-specialist tambem ter que ser um atirador profissional, matar em torno de mil caras pra poder chegar no final. eh ridiculo tambem que o seu inimigo tenha mil thugs para dispor e colocar no seu caminho pra voce estourar com bala.

seria o momento de voltar as origens, com o que foram os primeiros tomb raider e ate pitfall. nestes, o explorador estava contra os elementos. grafico nao eh limite para criar um cenario que conte sua historia, embora os cenarios de u4 respirem e vivam e contem suas historias, os cenarios de pitfall e tomb raider original tambem. neles o explorador estava contra os elementos. armadilhas, animais e como chegar de a a b. hoje pode parecer ridiculo e ate errado, a forma como lara croft e harry chegam chegando pra matar onça, tigre, urso polar, morcego, lobo, dinossauro e qualquer coisa que se mova, foda-se se eh ameaçado de extinçao ou nao, mas enfim, matar mil caras eh pior.

o jogo que conta menos pela narrativa da espaço pra historia ser contada pela mecanica e pelo cenario, consequentemente as mecanicas ficam mais refinadas, e a coisa final fica mais prazerosa de jogar.


por fim

uncharted 4 renova a coisa do jogo explorer/adventure/shooter/puzzle/plataformer de novo, eh o jogo mais bonito que eu joguei, com a historia mais bem contada, eh o jogo mais envolvente ate agora.

mas dessa vez ele ficou pra trás na parte das mecânicas, herdando defeitos dos seus antecessores que não henriquecem a história ou o jogo, mas estão ali apenas com uma sensação de seguir a industria (embora last of us é deles mesmo e eles mesmo, a naughty dog, que estão formando a industria nesse tipo de jogo) esperamos que esses elementos de mecânica sejam resolvidos ao passo que os desenvolvedores forem amadurecendo essas ideias.

em avaliação final, acredito que uncharted deve ser visto mais como um filme ou uma mini-serie do que como um jogo, eh um filme que coloca um pouco do controle na sua mao, nao o contrario, e so tem demerito nisso da parte de ser confundido com o oposto.

tendo dito isso, da parte de narrativa o jogo poderia ser menos formulaico, da parte jogo, as mecanicas poderiam ser mais envolventes. e mesmo metendo o pau, a gente mete o pau pq a coisa eh muito boa. indiana jones e lara croft estão ultrapassados por muito e um competidor precisará de muito para superar nathan drake.